Nesta terceira parte da nossa série de artigos, inspirada nos ricos debates do 5º episódio do ABRAz Talks, voltamos nossa atenção para um dos pilares mais sensíveis e essenciais no universo do Alzheimer: o cuidador familiar. Após explorar o voluntariado e o papel da ABRAz, mergulharemos nos desafios, na importância da saúde mental e nas estratégias de autocuidado para aqueles que dedicam suas vidas ao cuidado de um ente querido.
A jornada do cuidador familiar muitas vezes não é uma escolha, mas sim uma imposição das circunstâncias. Como ressaltado na live, frequentemente “a gente não escolhe, a gente é escolhido,” e às vezes “a gente não tem muita opção.” Isso acontece porque o familiar, como um filho único, uma filha separada ou sem cônjuge, é “imposto” a assumir essa responsabilidade, especialmente quando o idoso apresenta a doença de Alzheimer. A realidade é, muitas vezes, “dramática, mas é real,” especialmente para aqueles em situações de vulnerabilidade, como uma “filha única, essa filha é mãe solo, ela tem que trabalhar e ela não tem parente próximo que possa ajudar. Tem uma renda muito baixa, mora num lugar… Como vai cuidar sozinha dessa idosa?” Essa descrição pungente ilustra a sobrecarga e a solidão que muitos cuidadores enfrentam.
Dentro desse cenário desafiador, surge um comportamento comum: o “super-herói da situação.” O cuidador, movido pelo amor e pela responsabilidade, tende a “centralizar tudo em mim,” acreditando que “tem tudo sobre controle” e que “isso não vai acontecer comigo.” Essa centralização, porém, é uma armadilha que leva a um “esgotamento emocional,” que é “uma das primeiras coisas que acontece.” Não é raro que o cuidador desenvolva “quadro de depressão, o início de ansiedade, um transtorno de burnout,” o que impacta não só a si mesmo, mas também a qualidade do cuidado oferecido ao paciente. “Se você está estressado, automaticamente esse estresse vai passar para esse familiar que tá com demência.” É um ciclo vicioso que afeta a todos os envolvidos.
A ABRAz, ciente dessa realidade, enfatiza a necessidade de um olhar integral. “O cuidador muitas vezes é deixado de lado. E dentro da ABRAz… é uma das prioridades. É esse olhar mútuo de tipo ‘Olha, cuidador, você tem que tirar um dia para você, você tem que cuidar do outro, mas você tem que dar prioridade para você, porque a tua saúde mental ela necessita para você estar bem, para poder olhar para o outro.'” A cura e a gestão dessa sobrecarga vêm com estratégias como “delegar” tarefas e buscar ajuda. Reconhecer a própria vulnerabilidade é o primeiro passo para a prevenção, pois “a ficha só cai quando a gente adoece.” A falta de prevenção e a ausência de uma educação para o envelhecimento ativo na nossa sociedade tornam essa transição ainda mais difícil.
O conhecimento, nesse contexto, é um aliado poderoso. Ele não só capacita o cuidador a entender melhor a doença e suas fases, mas também oferece “economia.” Saber, por exemplo, que “tal medicação você consegue no SUS” ou que existe a possibilidade de “desconto para compra de carro com isenção de IPI” pode “reduzir custos, porque é uma doença complicada. É uma doença onerosa financeiramente.” O acesso a essas informações, muitas vezes compartilhadas nos grupos de apoio, cria uma rede de suporte prático que alivia o fardo financeiro e burocrático.
Os grupos de apoio da ABRAz desempenham um papel crucial no suporte ao cuidador. Eles são um espaço onde a “troca de informação” é “enriquecedora,” pois “não existe receita pronta” para lidar com o Alzheimer. Cada ser humano é único, e o que funciona para um pode não funcionar para outro. Essa “riqueza dessa troca” permite que os cuidadores encontrem estratégias, compartilhem experiências e percebam que não estão sozinhos. É onde se compreende que “o cuidador gostando ou não, gostando, querendo, não querendo, Se ele não tiver bem, ele não vai conseguir cuidar do outro para a gente cuidar do outro ou de alguma coisa. A gente tem que estar bem.” Essa verdade fundamental é o cerne do autocuidado.
Infelizmente, a saúde pública ainda apresenta “uma deficiência de suporte para as famílias” e para os cuidadores. A infraestrutura de apoio, como “centro de convivência” ou “centro dia” especializado para pacientes com Alzheimer, ainda é escassa em muitas regiões, forçando o familiar a assumir a maior parte do cuidado. A luta da ABRAz, por meio de iniciativas como o Setembro Roxo e a atuação em Brasília, é justamente para que essa realidade mude e que haja mais conscientização e recursos para todos os envolvidos.
Em suma, a jornada do cuidador familiar é complexa e exige um olhar atento para sua saúde física e mental. A ABRAz, com seus grupos de apoio e a promoção do conhecimento, oferece um espaço vital onde o cuidador pode encontrar acolhimento, estratégias e, acima de tudo, a lembrança constante de que cuidar de si é fundamental para poder cuidar do outro.
No próximo e último artigo, abordaremos a prevenção do Alzheimer e a importância do envelhecimento ativo, com base nos 14 fatores de risco discutidos na live.